sábado, 10 de fevereiro de 2007

Por que Clodovil é notícia?

Bem que o novo presidente da Câmara se esforçou. Segundo a “Folha”, Arlindo Chinaglia imprimiu novo ritmo aos trabalhos, acenou com votação próxima do carnaval, ameaçou cortar verba de faltosos. (E não por acaso já foi mal visto pelos colegas...) Mas, em termos de atenção da mídia, nada se comparou, nos primeiros dias de funcionamento do Congresso, à presença marcante do deputado Clodovil Hernandes. Há aí um lado bom e um lado ruim.

O lado ruim não tem muito segredo. Numa Casa machista (como mostra o post abaixo, sobre as poucas deputadas eleitas), ao chegar um costureiro, com trejeitos típicos do anedotário sobre homossexuais, a mídia reproduz o assanhamento dos parlamentares diante do “estranho no ninho”. Quando Clodovil passa no Salão Verde, brotam risinhos, frases maldosas. Aceita-se ainda seu lado “divertido”, mas todos ficam prontos para enquadrar o estranho. Como num colégio.

Sim, Clodovil também é conhecido por “dizer o que pensa” – mas não está aqui a explicação para o interesse da imprensa, pois desde quando ela se interessa pelo que pensam deputados de um partido nanico (PTC) e sem maior projeção política? Claro que há uma combinação de fatores, mas a perseguição de cinegrafistas, fotógrafos e repórteres ao deputado ocorreria igualmente se ele fosse um mitômano.

O lado bom desses holofotes (desproporcionais à sua real representatividade) foi delineado pelo próprio deputado em seu primeiro discurso no plenário. Ele estava certo: seus novos colegas não têm, em sua maioria, educação nenhuma. Agem mesmo como se estivessem num mercado municipal. Ao contrário de parlamentos de outros países, onde ainda se atenta à sobriedade (Clodovil acertou ao perguntar “onde está o decoro”), nossa Câmara não se respeita.

Por ser estranho no ninho, e ousado e vaidoso, o parlamentar (que não deixa também de representar um desejo da sociedade por gente diferente na Câmara), captou de pronto essa distorção. Esse circo. Ao qual estão acostumados todos que ali trabalham – funcionários, jornalistas. Estes, em boa parte, em exercício de mimetismo, reproduzem entre si frases dos parlamentares sobre Clodovil (e desde antes da posse...). “É assim no início. Depois baixa a bola. Ah, ele logo vai ser escanteado, em meio ao cotidiano do plenário e das comissões, e vai sumir”.

No dia da diplomação, em São Paulo, um deputado sério do PSDB paulista, o atual líder do partido Antônio Carlos Pannunzio, comparava os deputados a universitários: “alguns só andam em turma, agem como tais, marcam o ponto como estudantes que assinam a lista e vão embora, há até os que moram juntos, como se fossem repúblicas estudantis”... Clodovil teve um mérito quase artístico ao perceber isso logo no primeiro dia de sessão. E – admitamos – um mérito político ao protestar.

O novo deputado não é exatamente um detentor do bom senso. Foi processado por ter chamado, durante um de seus programas na televisão, a vereadora paulistana Claudete Alves (PT) de “macaca de tailleur”. Agora, demonstrando confusão entre público e privado, anunciou uma reforma em seu gabinete - a ser paga com o próprio dinheiro - que inclui uma cobra naja como base de mesa. E uma cobra chamada “Marta”.

Mas sua posição de franco-atirador já conseguiu uma façanha, numa Câmara viciada. Clodovil calou o plenário e por isso (gostemos ou não dele) entrou para a história parlamentar. Não a história das grandes votações ou conchavos, mas a “história do cotidiano” do Parlamento, a dos gestos e discursos, a comportamental. Sua fala valeu nesse sentido tanto quanto a dança da deputada Ângela Guadagnin, no ano passado. Com a vantagem de, nesse caso, não estar do lado do escárnio.

Note-se que um dos outros três deputados que estão fazendo reformas por conta própria em seus gabinetes, Bispo Rodovalho (PFL-DF) deu outra bola dentro neste início de mandato: tirou as divisórias asfixiantes das saletas (para quem nunca viu, um gabinete parlamentar costuma ser um ambiente apertado, com biombos mal-ajambrados e mesões sub-utilizados), colocando um vidro e uma mesa menor. “O vidro é para que todo mundo se veja no ambiente de trabalho”, disse ele.

Bingo. Divisórias de vidro nos gabinetes também foi uma bela idéia. Transparência já. No plenário e nas comissões sem divisórias, porém, o que se observa tradicionalmente em Brasília é a celebração dos interesses privados. E da falta de transparência. Se Clodovil Hernandes aproveitar seu capital midiático para protestar ciclicamente contra essas promiscuidades (mesmo que não saiba o que é o PAC e que não entenda os lobbies costurados entre cochichos e gargalhadas), terá feito um grande serviço ao País.

À mídia, cabe refletir sobre a frase acima: ora, quem deveria prestar diretamente esse serviço é ela, mídia, não o Clodovil.
Brasília, capital da costura.
foto: J.Batista/Agência Câmara

2 comentários:

Anônimo disse...

Alceu,
não é um comentário sobre o texto, mas sobre o blog. É que não localizei onde posso fazer isso.

Parabens pela iniciativa. Vou acompanha-lo(la).

Um abraço forte,

John.

Anônimo disse...

Meu Caro Ex-Vizinho,

Eu TEMO que ele vá cumprir uma promessa de campanha... A de que Brasília não iria ser a mesma depois dele...

Bom, já que ele(a) é deturpado... vamos ver o que acontece nos próximos 4 anos...

Abração!