sexta-feira, 16 de fevereiro de 2007

Câmara Bilionária (IV)


Segue trecho da terceira reportagem da série Câmara Bilionária, intitulada "Um mercado imobiliário muito particular":

"Da carência à fartura: em um País com déficit de moradia estimado em 7 milhões de unidades, 503 deputados têm juntos mais de 3 mil imóveis urbanos, no valor de R$ 214 milhões. Mais da metade desses imóveis (1.654) são lotes e terrenos sem construção. A partir dos dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a reportagem constatou que há lote declarado por até R$ 16,72. Distribuídos em cidades de 11 Estados brasileiros, 50 desses lotes foram estimados pelos deputados em R$ 22 mil, numa média de R$ 440 cada – valor aproximado de uma televisão de 20 polegadas.

O TSE não forneceu dados sobre 10 dos 513 parlamentares. Foram considerados neste levantamento os deputados que tomaram posse no dia 1º de fevereiro. Esses 503 eleitos possuem 568 apartamentos, 473 casas e 51 prédios, além de 208 imóveis comerciais, 13 barracões e 5 galpões, entre outros especificados apenas como “imóveis”. O apartamento mais caro, segundo a declaração de Carlos Bezera (PMDB- MT), fica na Rua Presidente Marques, em Cuiabá, e custa mais de R$ 15 milhões. Fica no Edifício Fontana di Trevi, nome da fonte romana consagrada pelo filme “La Dolce Vita”, de Fellini.

A série “Câmara Bilionária”, iniciada no domingo, 04 de fevereiro, mostra que os 503 deputados reúnem uma fortuna de R$ 1,25 bilhão, maior que o orçamento anual de Roraima. Os imóveis urbanos são o segundo investimento mais comum entre eles, atrás das empresas e à frente dos imóveis rurais (excluídos os equipamentos agrícolas), do dinheiro guardado ou aplicado (em bancos ou ações) e dos veículos – a reportagem de ontem mostrou que, à exceção do Gol, os modelos mais consumidos por eles são o Pajero, o Corolla e o Hilux.

Pelo Brasil

Cinqüenta e nove imóveis foram estimados em mais de R$ 500 mil cada. Mas entre as residências há três declaradas por menos de R$ 1 mil. O deputado Armando Abílio (PTB), um dos 15 que trocaram de partido antes mesmo da posse, possui 1/3 de casa de R$ 555 em Diamante (PB); Roberto Balestra (PP), 7/8 de uma de R$ 693 em Inhumas (GO); e Manoel Salviano (PSDB), uma estimada em R$ 968, em Juazeiro do Norte (CE). Outras 14 valem menos que R$ 10 mil – pouco mais que o salário líquido dos parlamentares.

Entre os apartamentos a discrepância em relação aos valores de mercado não chega a tanto. Mas há caso de um prédio inteiro declarado por R$ 4,2 mil, pelo deputado Inocêncio de Oliveira (PR-PE). Valores mais altos, porém, também passam longe da realidade observada nas imobiliárias - por mais que nas declarações de bens não seja, desde 1998, necessário fazer alguma correção monetária (isto no caso de imóveis que não tenham recebido algum tipo de benefício).

Assim, na lista dos parlamentares é possível achar mais de um apartamento em Brasília por R$ 30 mil, em regiões onde são vendidos por mais de R$ 300 mil. Por motivos evidentes, a capital federal é o destino mais procurado entre os deputados de outros Estados: são 43 casas e apartamentos declarados, o dobro dos 21 pertencentes aos oito representantes do Distrito Federal. O Rio (na foto) vem em seguida, com 17 imóveis entre os “estrangeiros” e 122 entre os fluminenses.

Mesmo nas praias, sonho de consumo de tanta gente, não é difícil achar lotes por valores irrisórios. Um lote do deputado Pinotti (PFL-SP) na Praia do Léo, em Ubatuba, no condomínio Sertãozinho, foi declarado por R$ 357,28. Em Guarapari (ES), a deputada Rose Freitas (PMDB) possui 10 lotes por R$ 850 cada. Um terreno de 360 m2 na praia de Jacumã, em Conde (PB), está nas mãos do deputado Fernando Ferro (PT-PE) por R$ 6 mil. Outro lote na Praia do Barco, em Osório (RS), foi declarado por Onyx Lorenzoni (PFL) por R$ 2,4 mil.

Outro lado

A assessoria do deputado Carlos Bezerrra informou que houve um erro de digitação na declaração: o apartamento de R$ 15 mil, na verdade, vale R$ 150 mil. O deputado afastado Pinotti, secretário de Ensino Superior do governo José Serra, disse que a defasagem no caso do lote (que fica numa montanha, e não na praia) deve-se ao fato de ter sido comprado em 1983, e pela impossibilidade de se corrigir o valor nas declarações de Imposto de Renda."
Brasília, capital da elite.

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