segunda-feira, 16 de julho de 2007

Os olhos do Chico (1)



Escrevi para os diários da APJ quatro perfis de moradores da região do Rio São Francisco. Seus olhares, suas histórias. Confira:

1) O AMBIENTALISTA

O olhar dele é de esperança. Quando era criança, em Igreja Nova (AL), o rio desafiava os 40 quilômetros de distância e chegava até a porta de sua casa, na cheia. “Nadava e pescava no meu quintal”, conta Antônio Jackson Borges Lima, pequeno produtor rural e ambientalista. “Aprendi a nadar num pedaço de mulunga, uma madeira leve, tipo isopor”. A água chegava a 3 metros de profundidade. Algumas crianças morriam, e ele no início tinha de ficar preso em casa, entre outubro e março, para não morrer afogado.


As preocupações mudaram. Antes de falarem em transposição, Lima já se preocupava com o assoreamento. Hoje ele mora em Traipu, na margem alagoana do rio, onde coordena o primeiro e único museu sobre o Velho Chico. Ali ele coleciona objetos que contam a história dos moradores da região – como um moedor de café da Serra da Canastra, um liquidificador à corda, uma máquina de lavar de madeira. E registra a história da navegação no rio, das canoas aos vapores.


No Museu Ambiental Casa do Velho Chico as crianças aprendem a respeitar o mais Velho. Informam-se sobre queimadas, esgotos, garimpagem, agrotóxicos, irrigação. No sítio de 20 tarefas (ou 6 hectares), Lima planta árvores – somente pau-brasil, são dez. É um esforço de preservação da história, mas também de renovação. “Temos 504 municípios na região, todos jogando esgoto no rio”, diz o ambientalista.

O amor pelo rio nasceu da água no quintal e foi consolidado durante toda sua vida profissional. “Tive 32 férias, todas navegando no Baixo São Francisco”, conta Lima, um fiel apaixonado. Ele era funcionário do Banco do Nordeste e trabalhou em várias agências na beira do rio: em Pão de Açúcar e Penedo (AL), Gararu, Neópolis e Ilha das Flores (SE).

“Casei com moça de Traipu, tinha esse sitiozinho na beira do rio, aí construí o museu.” Museu e biblioteca. “Idéia é construir um auditório, para 50 pessoas, um barco-escola e um caminhão-baú, um caminhão itinerante”.

Durante as férias o ambientalista viu duas coisas: pobreza e ausência de projetos. Cita o caso de um assentamento na beira do rio, em Traipu, com 120 famílias. “Eles têm todas as condições: água, energia, gente, terra”, enumera. “Mas falta projeto, apoio técnico e financeiro. Alagoas praticamente não tem projeto na minha margem do rio”.

Ele lembra que, antes da barragem de Sobradinho, o São Francisco produzia muito arroz e peixe. Agora, a expectativa é a de uma grande cheia em 2009. A maior que ele viu foi em 1979, e a cada 20 anos tem uma. “Se o efeito estufa não interferir”, diz.

A fala de Lima alterna melancolia à necessidade de resistência. “As espécies de peixe desapareceram. Tem jovem de 19 anos que não conhece o surubim. A tubarana (dourado) está em processo de extinção”, observa. “Lá no museu tem três meses que um pescador conseguiu uma tubarana de 16 quilos. Está lá, embalsamada, para as pessoas conhecerem”.

Um comentário:

Anônimo disse...

Sem água as pessoas não vivem... Mas ao mesmo tempo não cuidam do rio! Coitado do meu xará rio...